O pogrom verbal de Mucznick
Alan Stoleroff
Nos tempos que conduziram aos pogroms nazis, depois à "Kristalnacht" e finalmente à expulsão e ao extermínio dos judeus alemães, a propaganda hitleriana constantemente acusava os judeus da sua deslealdade para com a Pátria. "Imaginem", diziam os nazis, "que estes judeus vivem entre nós, como uma comunidade à parte, com as suas próprias identidades cosmopolitas, e não dão valor ao abrigo e à tolerância que nós, os alemães puros, lhes proporcionamos."
Ora, face aos acontecimentos de Acre, ou seja, ao "pogrom" racista de judeus contra árabes locais, e todas as informações de ataques contra árabes nas ruas de Israel, de ataques contra os palestinianos "preocupados" com a colheita das azeitonas nos territórios sob ocupação, Esther Mucznik veio hoje (23 de Outubro de 2008) no Público atacar a lealdade dos árabes israelitas ao Estado judaico de Israel, como é típico dela, agente voluntária que é da propaganda diplomática israelita! Repetindo a sua litania habitual, ela argumenta que em termos económicos e políticos os árabes israelitas estão, graças à democracia israelita, em melhor situação que os palestinianos dos territórios ocupados e que é por isso que optam na sua maioria por ficar em Israel. Contudo, diz ela, eles querem o nosso abrigo e tolerância sem aceitarem o carácter judaico do Estado de Israel, querendo mesmo regressar à situação anterior a 1948!
Não me surpreende que ela não se refira às expropriações e expulsões que em 1948 resultaram da guerra e da criação do Estado (e nomeadamente ao padrão residencial de Acre ), ou ao regime militar subsequente. Mas ao longo do seu queixume contra as reivindicações árabes pela cidadania plena em Israel, também não há uma palavra sobre a violência dos racistas ortodoxos judeus de hoje! O silêncio é revelador.
Israel é de facto um estado bi-nacional, com uma maioria e uma minoria. Nessa circunstância, a questão do carácter do Estado é e permanecerá problemática, mesmo no contexto de uma resolução da ocupação de Cisjordânia e Gaza com base em dois Estados, ou seja, com base na criação de um Estado palestiniano e na consolidação do Estado de Israel. Mesmo mantendo Israel como lar nacional dos judeus, uma democracia moderna tem não apenas de garantir, mas de promover os direitos da minoria. Todavia, na situação actual de ascensão da violência racista e religiosa, é evidente que a democracia israelita não pode ser tomada por adquirida ou tão-pouco a segurança dos árabes israelitas.
Assim, na minha opinião, e considerando o contexto da realidade actual israelita, ao som dos gritos de "Morte aos Árabes", Mucznik ficou esta vez no limiar de um apoio às reivindicações do Partido Yisrael Beiteino, do "russo" Avigdor Lieberman, para a constituição de um Estado etnicamente "puro" e para a "transferência" dos árabes, eufemismo para as tentativas de limpeza étnica em curso por parte dos fascistas mascarados como judeus religiosos.
Lisboa, 23 de Outubro de 2008