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SOLIDARIEDADE COM A PALESTINA

Informação sobre a ocupação israelita, a resistência palestiniana e a solidariedade internacional *** email: comitepalestina@bdsportugal.org

SOLIDARIEDADE COM A PALESTINA

Informação sobre a ocupação israelita, a resistência palestiniana e a solidariedade internacional *** email: comitepalestina@bdsportugal.org

Gaza e o Ghetto de Varsóvia – um inventário de analogias

Um artigo de António Louçã

publicado no jornal Mudar de Vida, 14 de Janeiro de 2009

 

A invasão de Gaza pelo exército israelita reproduz uma série de padrões de procedimento bem conhecidos noutros genocídios do passado. Acusa-se o Hamas de ter provocado a invasão ao lançar morteiros sobre as antigas povoações palestinianas, hoje colonizadas por Israel. O nazismo afirmava também que tinham sido os judeus a provocar a nação alemã, através duma conspiração mundial contra ela. A Alemanha nazi nunca proclamou a sua intenção de exterminar os judeus e sim a necessidade de se “defender”.

Insinua-se que os palestinianos são um povo selvagem, como se prova pelo fracasso da administração palestiniana em Gaza desde a retirada israelita. Primeiro fecham-lhes as fronteiras marítimas, aéreas e terrestres, cortam-lhes o combustível, destroem-lhes as centrais eléctricas, paralisam-lhes a rede de saneamento básico, privam-nos de medicamentos e comida, obrigam-nos a viver com uma ração mínima de água, ainda por cima salobra. Depois apontam-lhes o dedo acusador. O nazismo procedera de forma idêntica ao preparar o extermínio dos Judeus. Expropriara-lhes casas e empresas, expulsara-os dos empregos. A partir de certa altura começara a ghettoização.

Em Gaza vive cerca de um milhão e meio de pessoas, quase todas sem nenhuma possibilidade de conseguir emprego e quase todas dependentes da ajuda alimentar da ONU, quando essa ajuda é autorizada a entrar. O território, que o sociólogo israelita Baruch Kimmerling descreveu como a maior prisão existente a céu aberto, está cercado por todo o tipo de muros.
No ghetto de Varsóvia chegou a viver meio milhão de pessoas, também elas cercadas por um muro com 18 km de comprimento. Várias famílias foram empilhadas na mesma casa, em espaços limitados, com alimentação deficiente e condições de higiene indescritíveis. O resultado só podia ser o descalabro físico e psicológico da população ali concentrada, com milhares de pessoas a morrerem de fome ou de doenças curáveis. Depois de tornarem inevitável o descalabro, os nazis usaram o ghetto de Varsóvia como objecto de reportagens fotográficas e mesmo de um filme de propaganda, para mostrar como os judeus eram “sujos” e constituíam um risco de epidemias.

Durante um certo período, os palestinianos dos territórios ocupados eram vistos pelo Estado israelita como uma reserva de mão-de-obra barata e sem direitos. A economia israelita ganhava com essa massa de trabalhadores, até se perceber que com eles vinha também a resistência, nas suas mais variadas formas, desde as mais subtis às mais desesperadas. Aí passou-se a levantar cada vez mais dificuldades à contratação de trabalhadores palestinianos em Israel e a importar cada vez mais imigrantes doutros países. Do mesmo modo, os responsáveis nazis no Governo Geral da Polónia utilizaram até certa altura a mão-de-obra barata dos ghettos. É famosa a discussão entre os nazis “produtivistas”, que pretendiam continuar a explorar essa mão-de-obra, e os “atricionistas”, que pretendiam liquidar os ghettos e deportar os seus habitantes. Finalmente foram eles a prevalecer.

Diz-se que o Hamas deu “um golpe de Estado”, esquecendo que antes disso ganhara as eleições e fora afastado do governo pela potência sitiante. A verdade é que o Hamas era visto como um símbolo da resistência e a Fatah era identificada com a capitulação. Em consequência, o Hamas ganhou cada vez mais apoio popular e a Fatah passou a receber armamento ligeiro e facilidades logísticas de Israel. As tensões entre ambos foram artificialmente estimuladas a partir de fora. No ghetto de Varsóvia, havia organizações de resistência, principalmente socialistas e sionistas de esquerda, e havia polícias judeus armados pelos nazis. O confronto entre ambos era constante. A resistência cobrava um imposto revolucionário aos proprietários e, sempre que podia, castigava duramente os colaboracionistas judeus.

Atribui-se ao Hamas a intenção maquiavélica que fazer morrer as crianças palestinianas para ter muitos trunfos na sua agitprop internacional. Pouca atenção se dá à preocupação dos adultos palestinianos em evitar que as crianças corram riscos a apedrejar as forças ocupantes. Mas a população judia do ghetto constantemente enviava as suas crianças ao lado cristão de Varsóvia, com risco de vida, para levar mensagens ou fazer contrabando, porque as crianças tinham mais facilidade em passar por brechas do muro.

Acusa-se os palestinianos de criarem uma rede de túneis destinados ao contrabando de armas a partir do Egipto. O constante trabalho de escavação realizado pelos palestinianos seria uma prova da sua conspiração contra a paz. Por esses túneis passa algum armamento, mas passam essencialmente abastecimentos em comida e medicamentos. Ao prepararem-se para a insurreição do ghetto, as organizações de resistência judia escavaram milhares de bunkers subterrâneos. Após a derrota, a via de fuga foi mais uma vez subterrânea: os insurrectos utilizaram a rede de esgotos para escaparem.

O “sofisticado” armamento palestiniano viria, alegadamente, da Rússia, da China ou do Irão; o seu financiamento viria dos emiratos árabes. A verdade é que os palestinianos fabricam morteiros artesanais a partir de adubos, misturados em suas casas com colheres de pau e outros instrumentos de alta tecnologia, como mostrou uma recente reportagem de Henrique Cymermann. Os governos árabes mais uma vez os abandonaram à sua sorte, quando não os apunhalaram cinicamente pelas costas, como fazem o Egipto e a Arábia Saudita. Os combatentes judeus do ghetto de Varsóvia foram também quase totalmente abandonados pela resistência nacionalista polaca e viram-se obrigados a fabricar em suas casas cocktails Molotov e bombas artesanais.

Afirma-se que o Hamas (como em 2006 o Hezbollah) se mistura com a população para a utilizar como “escudo humano”. Mas os insurrectos do ghetto de Varsóvia viveram e combateram até ao fim no meio da população que queriam defender.
A demolição dos edifícios é a táctica israelita que denuncia a sua estratégia de limpeza étnica. Os sobreviventes, privados de um tecto, deverão ser tentados a emigrar. No ghetto de Varsóvia, os bombardeamentos aéreos e a utilização dos lança-chamas revelavam as intenções nazis de liquidação do ghetto.

Não é por acaso que em 2002 o exército israelita distribuiu aos seus quadros, como verdadeiro breviário para a acção contra os palestinianos, o relatório do general das SS Jürgen Stroop, que comandou a destruição do ghetto. Perante o escândalo público causado por essa revelação, o porta-voz do governo de Sharon, Rahanan Gissen, explicou que a escolha se justificava simplesmente por serem muito semelhantes as condições de combate aos palestinianos e as condições de combate aos insurrectos do ghetto. Em Fevereiro de 2008, o vice-ministro da Defesa israelita Matan Vilnai avisou que Israel iria fazer cair sobre Gaza um verdadeiro “Holocausto”. E está a cumprir a ameaça.

Vinho roubado

Quinta-feira, 29 Janeiro, 2009

O embaixador israelita na Grécia enviou em Dezembro a Theodoros Pangalos, deputado grego, três garrafas de vinho de boas-festas. Pangalos devolveu-as dizendo: “Reparei que o vinho que me enviou foi produzido nos Montes Golã. Desde criança ensinaram-me a não roubar e a não aceitar coisas roubadas. Não posso, pois, aceitar o presente e tenho de devolvê-lo. O seu país ocupa ilegalmente os Montes Golã que pertencem à Síria, de acordo com a lei internacional. Espero que Israel encontre segurança dentro das suas fronteiras internacionalmente reconhecidas, mas também espero que o seu governo cesse de praticar a política de punição colectiva aplicada em escala maciça por Hitler e os seus exércitos”.

Cronistas geminadas

Comité de Solidariedade com a Palestina

 

A pretexto de tudo valer nos artigos de opinião, o “Público” continua a dar guarida a uma sistemática desinformação sobre a ofensiva israelita contra Gaza. Nem a contradição gritante entre alguns dos seus fazedores de opinião e as excelentes reportagens que até aqui deu à estampa tem coibido o “Público” de entronizar Esther Mucznik, a “investigadora em assuntos judaicos”, e Helena Matos, a “jornalista”, como vozes autorizadas sobre o assunto.

 

Assim, foi silenciada nas páginas do jornal a rectificação sobre falsidades espalhadas por Helena Matos, que este comité enviou primeiro como carta ao director e depois como carta ao provedor do leitor.

 

Do mesmo modo, ficará certamente sem eco no “Público” a rectificação deste comité sobre as falsidades contidas no artigo de Esther Mucznik de 29 de Janeiro. Mas rectificamo-las, a começar por aquelas que se desmentem a si próprias: Mucznik afirma a dado passo que a ofensiva israelita serviu para “revelar ao mundo a gigantesca extensão dos túneis de contrabando de armas” (e aproveita para lamentar o fim da ocupação da Faixa em 2005). Logo a seguir, afirma contudo que o Hamas lucra todos os meses uns seis a oito milhões de euros em taxas pela utilização dos túneis. Ora, se os túneis se destinassem principalmente ao contrabando de armas, seria o Hamas o principal destinatário dessas armas e mal se compreenderia que lucrasse com taxas cobradas ... a si próprio.

 

A verdade está muito clara nos trabalhos de Alexandra Lucas Coelho, que mostram como os túneis são um meio de sobrevivência para a população civil de Gaza. Através deles se obtém tudo o que é indispensável à vida do dia-a-dia. É de admitir que as receitas cobradas pelo Hamas sejam elevadas, porque a população está disposta a pagar tudo o que pode por bens de primeiríssima necessidade. E a obsessão dos políticos e militares israelitas em cortarem essa veia jugular da vida na Faixa explica-se, não por quererem impedir um tráfico de armas residual, mas por quererem sufocar a população civil e obrigá-la a partir para sempre. A sanha israelita contra os túneis faz parte da estratégia de limpeza étnica e de genocídio.

 

Mas, se Mucznik se contradiz de linha para linha e de cada palavra para a seguinte, já a sua coordenação com Helena Matos é perfeita. Ambas escrevem na mesma edição do “Público” contra a resolução pela geminação entre a capital portuguesa e a capital da Faixa de Gaza, aprovada na Assembleia Municipal de Lisboa. Helena Matos limita-se a um gracejo de mau gosto sobre os túneis e sobre Sá Fernandes – um trocadilho mais próprio para jogos florais dalguma colectividade decadente do que para comentar a morte de centenas de pessoas.

 

Mucznik, pelo contrário, quer ser séria e dá um puxão de orelhas, não apenas aos partidos de esquerda, mas também ao PS, PSD e CDS por se terem abstido. Se fossem apenas os de esquerda, o problema talvez se resolvesse com facilidade, proibindo-os de concorrerem às eleições, como ainda há pouco tempo o parlamento israelita decidiu a propósito dos partidos árabes contrários ao massacre de Gaza. Mas levantar-se, de dedo em riste, contra TODOS os partidos da democracia portuguesa, já é talvez ter mais olhos que barriga. Ou irão esses partidos todos e mais o “Público” como jornal de referência obedecer à intimação contida no artigo de Mucznik?

 

O Comité de Solidariedade com a Palestina, que lançou a campanha pela geminação entre as duas cidades, congratula-se por não existir ainda em Portugal uma "democracia" como a israelita, baseada na limpeza étnica e no silenciamento das vozes discordantes.

 

Eleições israelitas

Já não há moderados

Por Gideon Levy


Os três primeiros candidatos a primeiro-ministro são extremistas. Tzipi Livni e Ehud Barak foram para a guerra em Gaza e são portanto tão radicais quanto possível. Benjamin Netanyahu é mais radical apenas na retórica.

Não devemos deixar-nos enganar por esta campanha eleitoral, considerando Livni e Barak como moderados, em contraste com o "extremista" Netanyahu. Isso é uma ilusão. O Kadima e o Partido Trabalhista, os partidos do centro e da esquerda, levaram Israel para duas horríveis guerras no espaço de dois anos. Netanyahu ainda tem que fazer uma vez a guerra. É verdade que ele fala de forma mais radical que os outros dois, mas até agora só têm sido palavras, enquanto que os "moderados" foram até à acção radical, agressiva.

"Bibi é duvidoso e terrivelmente direitista", afirma a propaganda eleitoral do Kadima. Será? Livni e Barak são exactamente o mesmo.

Nenhum dos envolvidos na guerra de Gaza pode agora falar de paz. Aqueles que lançaram um golpe tão brutal sobre os palestinianos, apenas para semear mais ódio e medo entre eles, não têm a intenção de fazer a paz com eles. Aqueles que são responsáveis por ter atirado cápsulas de fósforo branco sobre uma população civil e ter destruído milhares de casas não podem falar no dia seguinte de dois Estados vivendo pacificamente ao lado um do outro.

Numa investida, Ehud Olmert, que emitiu algumas das declarações mais corajosas alguma vez feitas nesses meios sobre o fim da ocupação, transformou essas declarações num balbúcio cínico de clichés ocos. Quem agora acreditará que ele queria a paz? E quem acreditará Barak ou Livni?

Esta guerra desmascarou Livni, a mulher que nos havia prometido uma "política diferente". Ela, que enquanto ministra dos Negócios Estrangeiros era suposta mostrar ao mundo o lado simpático de Israel, escolheu apresentar uma face arrogante, violenta e brutal. Durante a guerra, ela gabou-se de que Israel estava a actuar "selvaticamente", ameaçou o Hamas "levar" e anunciou que o cessar-fogo viria a efectuar-se "quando Israel o decidisse".

Pelo que lhe dizia respeito, não existia mundo, nem Estados Unidos e Europa, nem Conselho de Segurança da ONU, nem outro lado ensanguentado e derrotado – apenas Israel decidiria. Nenhum ministro dos Negócios Estrangeiros tinha falado assim anteriormente.

Para ela não existe mundo, EUA e Europa, não existe Conselho de Segurança, não existe o outro lado exangue e derrotado - apenas Israel, que decide. Nunca antes algum ministro dos Negócios Estrnageiros falou desta forma.

 

Nas suas tentativas patéticas de assumir uma postura masculina, militarista, machista até, de alguém que saberia o que dizer se o telefone tocasse às 3 da manhã, Livni expôs-se como uma ministra dos Negócios Estrangeiros falhada, cujas palavras e acções não são diferentes das dos homens militaristas radicais à sua volta. Nenhum eleitor que se respeite e se considere um centrista convicto poderia votar nela. Quem votar no Kadima estará a votar na direita, que está ansiosa por embarcar em qualquer guerra e por arriscar-se a cometer os crimes que a acompanham.

Votar no Partido Trabalhista também significa votar na guerra e nos seus horrores. Este xerife da guerra, Ehud Barak, privou-se para sempre do direito moral de falar de coexistência, acordos políticos e diplomacia. Se ele acreditasse neles realmente, deveria ter-lhes dado uma hipótese antes de ir para a guerra, e não depois. Barak levou o exército para a guerra e Barak deve pagar por isso, juntamente com o seu partido de "esquerda", que se juntou aos partidos mais radicais, de extrema-direita, ao apoiar a ilegalização dos partidos árabes em Israel.

Avigdor Lieberman, Netanyahu, Livni e Barak são um único – eles todos votaram a favor de uma decisão antidemocrática. E não fiquem assustados com Lieberman – ele, também, só fala. Mas, pelo menos, fá-lo honestamente, ao passo que Barak dispara e intruja.

Seguramente, estes impostores ainda gozam do apoio de dirigentes mundiais, mas para muitas pessoas pelo mundo fora, eles tornaram-se fomentadores de guerras e presumíveis criminosos de guerra. A sua imunidade diplomática protegê-los-á – mas quem quer desses dirigentes, com as suas mãos ensanguentadas, para nos representar?

Não menos grave é o facto de não haver diferenças ideológicas entre os candidatos. Peçam a Barak e Livni para explicarem que diabo os distingue um do outro. Que discussão ideológica estarão eles a conduzir, para além de andarem à bicada para ver quem fica com os louros de ter conduzido a guerra?

Em frente deles está Netanyahu – o que tem ele para oferecer? "Paz económica". Após esta guerra, que não foi suficiente na sua opinião, a sua doutrina soa mais grotesca do que nunca.

É assim que nos encaminhamos para eleições – com três partidos à frente, pouco diferentes um do outro.

Costumávamos dizer: "Não existem moderados no mundo árabe". Agora somos os únicos que não têm moderados. Vota como desejares, mas não te enganes. Qualquer voto no Kadima, no Partido Trabalhista e no Likud é um aval à última guerra e um voto na próxima.

Fonte: www.haaretz.com, 26.01.09

A civilização dos bárbaros

Ehud Olmert,  primeiro ministro de Israel, acaba de manifestar o seu pesar pelas mortes e danos casusados aos civis em Gaza. Já a sua antecessora Golda Mair dizia “nunca perdoaremos aos árabes obrigarem-nos  a matar os seus filhos”.

Foram 1320 os mortos e 5600 feridos, cerca de 30% crianças. As perdas de Israel cifram-se em 13 mortos, dos quais 3 civis.

Israel atacou e invadiu Gaza alegando estar a ser agredido. Como sublinhou o dr. Fernando Nobre, na sessão de lançamento do Fórum Pela Paz e Pelos Direiros Humanos, estranha agressão essa em que o agressor sofre 100 vezes mais baixas que o agredido.

O bombardeamento sistemático de Gaza, por terra, ar e mar durante toda a operação, a intervenção dos carros de combate pesados destruindo tudo à sua passagem, nomeadamente as oliveiars arrancadas pela raiz para limpar os campos de tiro, deixariam o território inabitável, se os palestinianos não estivessem já habituados a verem as suas terras e casas destruídas pelo exército israelita desde há mais de 60 anos. A população de Gaza vai voltar às suas casas e reiniciar a lenta e dolorosa reconstrução de tudo o que foi destruído sistematicamente, sem terem onde se abrigar com temperaturas inferirores aquelas que aqui levam a Protecção Civil a decretar alerta laranja, sem terem que comer nem com que se tratar.

Por isso que, nesta situação de agressão bárbara, falar da necessidade de meter o Hamas no mesmo saco que os israelitas, porque é disso que se trata quando se acha que quando condenamos a agressão isarelita não podemos deixar de condenar a do Hamas, não cola bem.

O Hamas é um grupo fundamentalista, que tem um objectivo de poder arcaico e brutal, assente na subordinação política por via ideológica ou religiosa, como os judeus ortodoxos que, se não mandam, impõem a sua vontade em Israel. Mas o Hamas, perante a decadência e a capitulação da OLP face às manobras dos árabes e ocidentais, perante o poder  colonial esmagador e a violência inumana do apartheid sionista, respondeu aos anseios do seu povo: apoio social ímpar, combate à corrupção, radicalidade na resistência necessária à dignidade daquele povo. Por isso foi escolhido para governar, nas únicas eleições democráticas  nos países árabes.

O Hamas só ganhou força, ajudado e empurrado pelos isarelitas, porque a essência laica, democrática, plural e socialista da OLP se esfumou quando a primeira intinfada que ganhara a consciência e o apoio emocionado dos povos de todo o mundo  foi traída; e o ímpeto e o heroísmo da juventude palestiniana foi entregue de bandeja ao inimigo colonial, nas negociações de Camp David e nos acordos de Oslo, a troco de um reconhecimento formal da Autoridade Palestiniana, sem qualquer autoridade soberana , encarrregada de manter o povo na ordem  e ajoelhada  perante a potência colonial culpada dos mais bárbaros crimes contra esse mesmo povo. Nenhuma reivindicação da luta de décadas da OLP foi satisfeita, nem sequer a devolução dos territórios ocupados.

O único território desocupado foi Gaza, por Sharon, para  ficar disponível para as incursões de demolição e assassinato, para bombardeamentos e invasões militares que a presença dos colonos dificultava.

Sejamos claros, até porque um simples olhar de relance, minimamente descomprometido, não permite qualquer disfarce: a estratégia sionista, assumida desde sempre pelos governantes israelitas, e que atingiu agora um dos seus pontos culminantes, é a expulsão dos palestinianos da sua terra, no seguimento de todo um processo velho de cem anos. A primeira-ministra Golda Mair asseverava, em 1969 que os judeus não precisavam dos palestinianos para nada, aliás de acordo com a doutrina sioniosta que preconiza que a nação judaica deve ter as suas próprias classes sociais, incluindo a classe operária, pelo que os árabes não deviam ser explorados mas substituídos na sua totalidade.

Os que preconizavam um lar para os judeus na Palestina (fartos de perseguições, pogroms e expulsões, até ao holocausto final) tinham consciência de que tinham que ir ocupar terras de outrém: “do exterior somos levados a crer a que a Palestina é um territótio despovoado. Mas a verdade é que é difícil encontrar terras aráveis que não estejam cultivadas” dizia o judeu ucraniano

Ahad Haam por volta de 1892.

Depois – o judaísmo não se afirma apesar da história mas através da história, como dizia Marx - com a ajuda interesseira, mas desinteressada das pessoas, do colonialismo inglês e da bestialidade negra do nazismo, manobrando pelos interstícios da malha balcanizada do médio oriente depois da primeira guerra, o sionismo armou-se e preparou-se.

Esse processo passou pelo terrorismo contra os próprios ingleses e logo contra os camponeses palestinianos numa limpeza preparatória da  formação do Estado de Israel imposto pelas potências colonizadoras através da ONU .

A derrota dos exércitos árabes pelo recém formado Estado de Israel em 1948 teve como consequência o abandono das suas casas e terras por dois terços da população palestiniana que iniciou assim um longo calvário como refugiados em terra alheia e não poucas vezes enfrentando a hostilidade de governos e facções árabes que levaram a massacres e chacinas com a cumplicidade das forças ocidentais, como o setembro negro na Jordânia, a chacina no Libano, durante a guerra civil, levada a cabo pelas tropas sírias  e os massacres de Sabra e Chatila pela falange cristã, com a ajuda dos ocupantes israelitas.

Desde o confronto de 1948 que a estratégia israelita, de expulsão dos palestinianos da sua terra, passou a assentar na propaganda da ameaça árabe à existência do Estado de Israel como justificação para todas as atrocidades cometidas, quando é sobejamente conhecido que a causa palestiniana de uma pátria livre e soberana nada tem a ver com quaisquer posições ou reivindicações árabes nem sequer, desde há muito, com a unidade da nação árabe.

Tal propaganda não tem qualquer base mínima objectiva desde a guierra de Yon Kipur, quando o Exército egípcio levou de vencida o imbatível exército de Israel, logo recuando em seguida sem ter imposto as condições mínimas que se exigiam na altura e ainda hoje persistem: devolução dos Montes Golan à Síria e retirada dos territórios ocupados por Israel.

Ficou provado que a mítica ameaça ameaça árabe à existência de Israel não passa de propaganda e de justificação para a sua política de expulsão dos palestinianos da palestina

Ehud Olmert está compungido, mas nós estamos ainda mais porque sabemos que ele e os outros dirigentes israelitas, deste e de outros governos, não vão ser julgados como criminosos de guerra no TPI .

O espantoso, será?, nesta incomensurável tragédia que é a perseguição e o massacre de gerações de palestinianos,  é que a “sociedade civilizada” assiste a tudo isto de mãos postas e propositadamente atadas, decidida a garantir... a segurança de Israel!

O Embaixador israelita nas Nações Unidas, Aharon Leshno-Yaar, interpelou a Comissão dos Direitos Humanos da ONU, reunida em Genebra, de 12 de Janeiro último, e o representante da Autoridade Palestiniana, sobre se estavam convencidos que as resoluções da ONU serviam para alguma coisa! E deixou claro que “vocês têm-se entretido com resoluções e nós vamos fazendo o que nos apetece”. Assim, mais coisa menos coisa.

É preciso que nos entendamos: vão fazendo o que lhes apetece porque as principais potências (prineiro com a desculpa da guerra fria, agora porque sim.) estiveram sempre claramente dispostas a  impedir a afirmação de uma nação democrática, laica e progressista no Médio Oriente, que era o caso da OLP antes de se ter deixado corromper e passar da troca de “paz por terra” para a troca de “terra por dólares”.

A vista grossa vai ao ponto de nem sequer o facto de ter sido decretada a marginalização do processo eleitoral dos partidos árabes de Isarel ter feito enrugar as amplas testas dos senhores dos Estados altamente civilizados e poderosos.

E vêm falar-me do Hamas!? Lembram-se quando Pierre Bourdieu encabeçou um abaixo assinado insurgindo-se em termos violentos contra o governo francês e todas as nações democráticas e civilizadas por não reconhecerem a vitória eleitoral democrática do FIS na Argélia, apoiando a solução militar e fascistóide, do que resultou a explosão do terrorismo fundamentalista? Algo parecido aconteceu na Palestina.

A simplicidade da solução para a Palestina é esta: basta reconhecer o Estado Independente e Soberano da Palestina. E todos sabemos que isso não é ameaça nenhuma para Israel. Antes pelo contrário:é a garantia do seu sossego.

Por isso é que eu, quando me vêm com o Hamas convido-os a olhar, já nem falo no Bush, mas para os limpinhos da UE, a começar pelo nosso introspectivo mas simpático ministro dos negócios estrangeiros. 

Mário Tomé

Israel e o fluxo de queixas judiciais

Aluf Benn

(Publicado por CAPJPO-EuroPalestine)

 

O governo israelita começa a preparar-se para enfrentar uma avalanche de queixas judiciais, mas sublinha, o que é muito revelador, que estas últimas emanam de «pessoas e de associações, mais do que empresas governamentais»!! Leia-se o seguinte artigo do diário israelita Haaretz.

 

Israel teme uma vaga de queixas judiciais por crimes de guerra durante a ofensiva de Gaza

Israel prepara-se para uma vaga de queixas judiciais emanando de associações pró-palestinianas do mundo inteiro contra israelitas implicados nos combates em Gaza, invocando a sua responsabilidade em crimes de guerra ligados aos efeitos destrutivos das acções das forças de Defesa israelitas contra civis palestinianos e os seus bens.

Ministros israelitas exprimiram, nos últimos dias, sérios receios sobre a possibilidade de Israel vir a ser obrigado a dar o seu acordo a um inquérito internacional sobre as perdas causadas entre os não-combatentes durante a operação "Chumbo derretido"; ou então, hipótese alternativa, de que israelitas sejam confrontados com queixas individuais, como foi o caso de oficiais israelitas acusados de crimes de guerra na Grã-Bretanha pelos seus actos durante a segunda Intifada.

«Quando a extensão dos estragos em Gaza for patente, não voltarei a passar férias em Amesterdão, senão no Tribunal Internacional da Haia», declarou um ministro. É difícil determinar se ele estava a gracejar ou não.

Um outro ministro indica que, em contraste com a situação que se seguiu à operação Escudo Defensivo na Cisjordânia há sete anos, a zona atacada por Israel está desta vez totalmente sob controlo palestiniano. Por conseguinte, os jornalistas estrangeiros que vão penetrar na Faixa de Gaza para aí fazer as suas reportagens sobre as consequências da operação "Chumbo derretido" não serão escoltados por oficiais ou porta-vozes israelitas como o foram na Cisjordânia em 2002.

Os organismos de Defesa começaram a constituir dossiers a montante das queixas legais esperadas e prepararam a sua defesa relativamente às casas privadas atacadas em Gaza pelo exército israelita. Os elementos de prova incluem documentos sobre a localização dos depósitos de armas e os locais de onde o Hamas lançava rockets. Isaac Herzog (do Partido Trabalhista), ministro dos Assuntos Sociais, que coordena a ajuda humanitária para Gaza, vai também coordenar os esforços israelitas de relações públicas contra as acusações de crimes de guerra.

O principal perigo é suposto vir de queixas judiciais emanando de pessoas e associações, mais do que de empresas governamentais querendo abrir inquéritos oficiais. As altas personalidades esperam que a visita de responsáveis europeus a Jerusalém esta semana, e as suas declarações apresentando a ofensiva israelita como fazendo parte de uma guerra legítima contra o terror, vão ajudar Israel nas suas futuras batalhas jurídicas.

Israel sublinhará que agiu em Gaza em situação de legítima defesa e que consentiu grandes esforços para avisar os habitantes de que as suas casas estavam prestes a ser visadas e dar-lhes ordem de as evacuar. Israel recorreu a sms, lançou panfletos por via aérea e fez 250 mil telefonemas para avisar os habitantes de Gaza, difundindo avisos nas estações de rádio palestinianas. A sua defesa porá também em evidência a forma como o Hamas transformou casas, escolas, mesquitas e organismos humanitários em esconderijos de armas e em ratoeiras, explicando que esses locais foram atacados porque constituiam alvos militares legítimos.

Fonte: HAARETZ, 19.01.2009

De Lisboa para Gaza

Um cessar fogo que deixa Gaza à espera que o fogo cesse, em que a França, Grã Bretanha, Egipto, a República Checa e Espanha (em nome da "comunidade internacional") deram a sua aprovação a Israel pelo trabalho feito, num prato de prata cheio de cinzas.
Antes do ataque, a vida já não era vida no Gueto de Gaza, agora vai-se ver. Ontem à noite os primeiros relatos dos jornalistas da situação em Rafah eram de calamidade. Veremos.
Com o "cessar-fogo", o trabalho torna-se tão, senão mais, importante como antes. Gaza precisará de ajuda: os Palestinos que sobrevivem têm direito a uma vida normal. O "cessar fogo" tem que acabar com o bloqueio de Gaza. Será ainda uma luta para acabar com o bloqueio e o cerco, além de mais, não há garantia que Israel páre a matança: não vamos deixar a Gaza só nessa luta.
Àqueles e àquelas que foram mobilizados pela crise desta agressão óbvia na sua barbaridade, não se enganem, não se esqueçam dos Palestinos e da Palestina. Este episódio de 23 dias foi um momento numa ocupação que dura 41 anos e a Naqba que já fez 60.
 
Como diz Eduardo Galleano
"Ya poca Palestina queda. Paso a paso, Israel la está borrando del mapa."
 
 
 

De Lisboa para Gaza

(no dia de um cessar fogo)

 

Cercada pelo nevoeiro

a minha rua tornou-se cinzenta,

tantas gotas nascem da neblina,

pontinhas frágeis de luz pegadas

aos torcidos ramos das árvores descuradas

do jardim que mal sobrevive

atrás de um muro antigo

decorado com remendos e manchas de musgo –

à frente da minha janela,

são centenas de lágrimas que brotam,

donde virão em breve folhas e flores.

Vivo o esplendor do momento e do futuro,

sentindo apenas um frio ligeiro nos dedos,

enquanto protegido na minha privacidade

escrevo sobre bairros modernos,

bairros secos e ensolarados,

onde chove só fogo e fósforo,

onde nasce tanta morte

e mal resiste a vida,

um cemitério cercado por muros novos,

onde verde pode ser a cor de bandeiras

mas brancas são sempre as mantas dos defuntos,

bairros densos de desgraça, desertos humanos,

que terão de aguentar o presente

até a Primavera.

  

alan stolerov

18 Jan. 09

Invasão de Gaza - Criminosa e abjecta

Michel Warschawski*

 

Há que dizê-lo e repeti-lo: a carnficina de Gaza não é uma reacção “desproporcionada” aos morteiros que disparam os militantes da Jihad Islâmica e outros grupúsculos palestinianos contra as localidades israelitas próximas da Faixa de Gaza, e sim uma acção premeditada e preparada desde há muito, como reconhece a maior parte dos comentadores israelitas.

 

Há que dizê-lo e repeti-lo: estes disparos de morteiro não são“provocações inaceitáveis”, como querem fazer crer certos diplomatas europeus, e sim respostas, reconheçamos que bastante penosas, a um bárbaro embargo imposto por Israel, desde há um ano e meio, ao milhão e meio de habitantes da Faixa de Gaza, mulheres, crianças, idosos, com a criminosa colaboração dos EUA mas também da União Europeia.

 

Há que dizê-lo e repeti-lo: não se trata, como tentam explicar os que têm a memória curta ou selectiva, de um acto de “auto-defesa”, muito atrasado, perante uma injustificável agressão palestiniana. Ehud Barak confessa-o sem problemas: há meses que o exército israelita se preparava para atacar a “entidade terrorista” chamada Gaza. Como bem explicava Richard Falk, relator especial da ONU sobre os territórios ocupados, quando se define como “entidade terrorista” uma zona povoada por um milhão e meio de seres humanos, entra-se na lógica do genocídio.

 

Como o ataque ao Líbano de 2006, a agressão israelita inscreve-se na guerra global permanente e preventiva dos estrategas neo-conservadores no poder em Tel-Aviv e ainda por algum tempo na Casa Branca.

 

Como o seu nome indica, esta estratégia é preventiva e não precisa de pretextos imediatos e tangíveis: o Ocidente democrático estaria ameaçado por um inimigo global que se identificou em primeiro lugar como “terrorismo internacional”, depois como “terrorismo islamista” para finalmente se identificar simplesmente com o Islão. O “choque das civilizações” de Huntington não é uma descrição da realidade política internacional, e sim o quadro ideológico da estratégia ofensiva dos neo-conservadores americanos e israelitas, tal como foi elaborada em comum na segunda metade dos anos 80. Nesta estratégia de guerra, a ameaça islamista tem vindo a substituir o que tinha sido o perigo comunista durante a Guerra Fria: um inimigo global que justifica uma guerra global.

 

Se o criminoso bombardeamento de Gaza disfruta em Israel de um apoio consensual, se a esquerda institucional, e em particular o partido Meretz, juntou a sua pequena voz ao coro belicista dirigido por Ehud Barak, é precisamente porque partilhaa visão do mundo que faz do Islão uma ameaça existencial que é preciso neutralizar imperiosamente “antes que seja demasiado tarde”.

 

Ao horror do crime, é preciso acrescentar a abjecção das motivações imediatas; em breve terão lugar eleições gerais israelitas e as vítimas palestinianas são também argumentos eleitorais. Os mártires do ataque israelita contra Gaza são objecto de uma disputa mediática entre Ehud Barak, Tsipi Livni e Ehud Olmert, sobre quem é o mais enérgico na brutalidade. O criminoso de guerra que dirige o Partido Trabalhista, ou melhor, o que resta desse partido, gaba-se de ter ganho quatro pontos nas sondagens. Para além do cinismo sem limites que mercadeja 350 vítimas inocentes contra uns milhares de votos, Barak demonstra mais uma vez a sua miopia política: na luta para ver quem é mais bestial, e apesar de todos os seus esforços, nunca conseguirá superar Benjamin Netnyahu, porque o eleitorado prefere sempre o original e não a cópia.

 

Tanto mais que o chefe de guerra se encontra hoje confrontado com o mesmo problema que transformou a guerra do Líbano no fiasco israelita, um problema bem conhecido de todos os que iniciaram guerras coloniais: como terminá-la? “Não vamos parar enquanto não tivermos acabado o trabalho”, anuncia ele com toda a arrogância dos pequenos caciques. Mas quando terão “acabado o trabalho”? Quando a população de Gaza e da Cisjordânia estiver disposta a capitular perante os sonhos coloniais dos dirigentes israelitas e a limitar as suas aspirações nacionais a um “Estado palestiniano” reduzido a uma dezena de reservas isoladas umas das outras e cercadas por um muro? Se esse é o “trabalho” que Barak espera poder realizar, o povo israelita deve então preparar-se para uma guerra que não só será extremamente longa, mas interminável. E se o Estado judeu está bem armado para as Blitzkriege, sobretudo quando são levadas a cabo pela aviação, entra rapidamente em crise quando se trata de uma corrida de fundo em que são peritos os palestinianos, como todos os outros povos vítimas da opressão colonial.

 

É o que explica que, pouco depois de ter começado, e apesar das declarações triunfalistas de políticos e militares, o ambiente em Israel já esteja a mudar. No sábado passado, algumas horas depois dos bombardeamentos de Gaza, manifestávamos a nossa raiva e a nossa vergonha, pouco mais de um milhar de pessoas. Seremos muitos mais neste sábado à noite a exigir sanções internacionais contra Israel e a apresentação de Ehud Barak a um Tribunal Internacional. Estou seguro disso.

 

* Michel Warschawski é um jornalista israelita e dirigente do Centro Alternativo de Informação

 

O que faria se fosse palestiniano?

Referindo-se a um seu amigo israelita morto por um palestiniano de Gaza em 1955, Moshe Dayan (antigo ministro da Defesa israelita) escreveu:

". . . Hoje não podemos lançar acusações aos assassinos. Que razões temos para nos queixarmos do seu ódio intenso por nós? Estão confinados desde há oito anos nos seus campos de refugiados em Gaza e perante os seus olhos fazemos das terras e das aldeias onde eles e os seus antepassados viveram o nosso lar.

 

Não devemos pedir contas por este sangue derramado aos árabes [palestinianos] de Gaza, mas a nós mesmos… Façamos hoje o nosso balanço. Somos uma geração de colonos e, sem o capacete de aço e a arma de fogo, não conseguiremos plantar uma árvore ou construir uma casa… Não tenhamos receio de ver o ódio que acompanha e consome as vidas das centenas de milhares de árabes [palestinianos] que se sentam em torno de nós à espera do momento em que o nosso sangue esteja ao alcance das suas mãos." (Iron Wall, p. 101).

Também Ehud Barak (outro ministro israelita da Defesa) afirmou, respondendo à pergunta "O que faria se fosse palestiniano?":

"Se eu fosse um palestiniano com idade para isso, acabaria por aderir a uma das organizações terroristas." (Entrevistado por Gideon Levy do Ha'aretz em Março de 1998).

Cortina de fumo sobre Gaza*

O artigo de Helena Matos no Público de 8 de Janeiro só pode causar náuseas, por constituir uma cortina de fumo informativa, a acrescentar às colunas de fumo causadas pelos bombardeamentos. A jornalista empenha-se em obscurecer a realidade essencial da actual campanha israelita contra a população de Gaza: a esmagadora maioria das crianças mortas no conflito israelo-palestiniano (numa proporção pelo menos de 1 para 100) são crianças palestinianas vítimas do fogo israelita. Este é um facto que nem Helena Matos poderá negar.

 

Por não poder negá-lo, limita-se a tentar ocultar a floresta com duas árvores - dois exemplos de há uns anos atrás em que crianças palestinianas terão sido vítimas de balas perdidas do próprio lado palestiniano. Não conhecemos o caso de Huda Ghaliya, que Helena Matos cita, e admitimos que seja verdadeiro. Um caso: para quantas crianças vítimas hoje, ontem e anteontem, amanhã e depois, do genocídio israelita?

 

Conhecemos sim, o outro caso que HM cita, o de Muhammad al-Durrah. HM também deveria estudá-lo e informar-se antes de escrever sobre ele. Com efeito, quando HM recorda "a imagem da criança tentando proteger-se sob o cadáver do pai", deveria saber que a imagem era do pai, vivo, tentando proteger a criança. Quem morreu foi a criança, o pai foi apenas ferido e sobreviveu ao tiroteio.

 

Quando HM critica os seus colegas jornalistas porque, afirma, "rapidamente espalharam esta imagem" e "não se deram ao trabalho de divulgar as investigações que provavam a sua manipulação", deveria saber que na altura não havia ainda qualquer investigação branqueadora do exército israelita. Pelo contrário, todos os altos responsáveis israelitas que se pronunciaram, admitiam os disparos israelitas como causa da morte do menino: o major-general Giora Eiland e o vice-ministro da Defesa Ephraim Sneh apresentaram desculpas; o primeiro-ministro Ariel Sharon, o major-general Moshe Yalon e o major-general Yom Tov Samia culparam o lado palestiniano, mas admitindo sempre que os disparos fatais tinham provindo do lado israelita.

 

Anos depois, a propaganda israelita decidiu pôr em causa os factos e lançou uma "investigação" que o diário liberal israelita Haaretz classificava como "bizarra", acrescentando que a sua "estupidez" saltava à vista. Mesmo o então chefe de Estado Maior do Exército, Shaul Mofaz, sentiu a necessidade de se demarcar publicamente da tal "investigação". Um outro oficial superior israelita, falando sob anonimato ao The Times, dizia que a "investigação" viera juntar mais "vergonha ao que foi um terrível acidente". Se HM quer fazer propaganda israelita, sem acrescentar "mais vergonha" ao caso, deveria documentar-se primeiro e ajustar a sua versão à dos genocidas que tanto admira – a de Sharon, de Mofaz, dos generais israelitas, não a de investigadores "bizarros" e "estúpidos".

 

Comité de Solidariedade com a Palestina

 

* Este texto foi enviado ao Público como Carta ao Director. O jornal não o publicou.

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